É muito possível que você tenha escutado por aí a repetida história em que pessoas disponibilizam o próprio medicamento de cannabis á amigos e familiares, como forma de experimentar e ainda prescrevem a dose e a frequência com que irão tomar.

Dosagem os produtos à base de cannabis medicinal individualmente é um desafio mesmo para os médicos mais experientes do assunto e demanda muito além de achar que a dose é referente ao peso ou ao tipo de doença, vai um pouco além disso e pode não parecer mas é bastante complexo.

“A dosagem de cannabis é diferente de qualquer agente terapêutico ao qual fui exposto em minha formação médica”, diz Dustin Sulak, um dos médicos mais experientes na endocanabinologia dos Estados Unidos, que atende pacientes em escritórios no Maine e Massachusetts. “Alguns pacientes usam efetivamente pequenas quantidades de cannabis, enquanto outros usam doses incrivelmente altas. Já vi pacientes adultos alcançarem efeitos terapêuticos com 1 mg de canabinóides totais diariamente, enquanto outros consomem mais de 2.000 mgs diariamente sem efeitos adversos.”

Iremos observar vários pontos importantes quanto se refere á dose e frequência, abordando situações que servem de padrão para a utilização desses produtos, se você é alguem saudável e utiliza de forma adulta talvez isso não faça tanto sentido, mas para aqueles que procuram um efeito duradouro, tratamento para uma patologia específica e ainda utilizam medicamentos concomitantes, sugiro que observem com bastante atenção os próximos tópicos.

MICRODOSAGEM

Uma das grandes dúvidas dos pacientes é se vão ter efeitos psicoativos ou ficar “chapados” com o uso terapêutico dos canabinoides. Na prática, o que temos observado, nas subdoses ou microdoses, abaixo das doses que induzem efeitos intoxicantes, é que permanecem grande parte dos beneficiários desse tratamento.

Essas doses serão ajustadas com o tempo de uso e muito provavelmente ocorrerá a tolerância ao longo desse processo fazendo com que o paciente atinja doses maiores, sem efeitos exagerados, mas ainda assim nas subdoses que podem induzir efeitos euforizantes. É claro que existem situações em que os pacientes necessitam de utilizar doses maiores, principalmente nos casos de dor crônica, que por vezes se beneficiam com as doses próximas daquelas indutoras de efeitos colaterais ( isso é um problema a ser manejado pelo médico com redução dos danos do THC , através de canabimiméticos ou até medicamentos próprios pra isso ).

GERENCIANDO SUA DOSAGEM CANNABIS

Cada indivíduo possui a sua relação de sensibilidade com o THC e sendo assim é necessário que consiga encontrar essas doses partindo das menores doses possíveis.

O uso bem-sucedido da cannabis como medicamento depende em grande parte do gerenciamento de suas propriedades intoxicantes. Muitas pessoas gostam da maconha; para outros é desagradável. A sensibilidade de uma pessoa ao THC , o principal componente intoxicante da cannabis, é fundamental para implementar um regime de tratamento eficaz.

De um modo geral, existem três quimotipos de produtos de cannabis disponíveis atualmente no Brasil :

• Tipo 1 ( dominante em THC ) – alto THC , baixo CBD . Podem estar disponíveis na sua forma natural como o Delta 9 THC em concentrações maiores que 0,3 % ( apenas associações em solo nacional ) ou em concentrações maiores na sua forma de Delta 8 THC ( importados pela ANVISA )
• Tipo 2 ( THC e CBD ) – Cultivares mistos de THC e CBD em diferentes proporções
• Tipo 3 ( dominante CBD ) – Alto CBD , baixo THC (maconha ou cânhamo não eufórico)


Há também um quarto tipo – aquelas raras cultivares de cannabis que expressam de forma proeminente um chamado canabinóide menor (como CBG ou THCV ). Mas em termos do que está atualmente disponível para os pacientes, a proporção THC : CBD é primordial e deve ser considerada ao formular estratégias de dosagem.

Então, qual é a dosagem apropriada para cada um dos três principais tipos de cannabis?

COMECE BAIXO E VÁ DEVAGAR

O ditado “comece baixo e vá devagar” se aplica à terapia com cannabis, em geral, e à titulação de THC / CBD em particular. 

Se um novo paciente for fumar ou vaporizar cannabis rica em THC , é indicado que comecem com uma única inalação e esperem 15 minutos antes de inalar novamente . Os efeitos da cannabis inalada geralmente podem ser sentidos em poucos minutos, proporcionando alívio rápido da angústia aguda. Se necessário, pode-se inalar uma inalação adicional a cada 15 a 30 minutos “até que o controle dos sintomas desejado seja alcançado”. Neste formato ainda é possivel ajustar a dose de forma mais segura tendo em vista que a ação é rapida e também foge do efeito de primeira passagem hepática que potencializa os efeitos colaterais, transformando em 11 Hidroxi THC.

Quanto à administração oral, deve-se ter em mente que pode levar de 60 a 90 minutos antes que os efeitos de uma dose única sejam sentidos.

Na administração oral exija-se regime cuidadosamente titulado para o consumo de produtos de cannabis ricos em THC ingeríveis. Sugiro iniciar ingerindo o equivalente a 0,75 a 1,5 mg de THC por dose e aguardar quatro dias antes de aumentar a dose em 25%. Continue a aumentar a dose de THC em mais 0,50 a 1,0 mg a cada quatro dias até que os efeitos desejados sejam alcançados.

Se houver efeitos colaterais adversos, reduza a dose de THC para a quantidade anterior que foi bem tolerada.

Doses acima de 20 mg do THC por dose devem ocorrer em casos específicos tendo em vista os efeitos de curto e longo prazo do uso excessivo desse canabinoide. Acima dessa dose a conduta deve ser balanceada no custo x benefício.

Para a maioria dos medicamentos, uma dose mais alta terá um efeito terapêutico mais forte. Com a cannabis, no entanto, não é tão simples. O THC e outros componentes da cannabis têm propriedades bifásicas, o que significa que doses baixas e altas geram efeitos opostos. Pequenas doses de cannabis tendem a estimular; grandes doses sedativas.

Em termos práticos, isso significa que começar baixo e aumentar gradualmente a dose de cannabis produzirá efeitos mais fortes no início . Mas, depois de um certo ponto, “aumentos de dosagem podem resultar em efeitos terapêuticos mais fracos”, segundo o Dr. Sulak, “e um aumento nos efeitos colaterais”. É importante notar que cada corpo responde ao THC de maneira diferente e cria tolerância em taxas diferentes. Da mesma forma estacionar em uma dose específica pode fazer com que os efeitos reduzam bastante a eficácia com o tempo sendo necessário aumentar a dose novamente.

Aqui no Instituto de Medicina Orgânica aplicamos essas regras e conforme nossa experiência, ao atingirmos os efeitos desejados, o paciente passa a ter que realizar um “jejum” de cannabis a cada 4 ou 5 meses, interrompendo o tratamento por três (03) dias e retornando com a metade da dosagem, e desta vez aguardando os efeitos começarem a reduzir para aumentar novamente 0,5 a 1,0 mg. E isso se torna um ciclo em que o paciente permanece nas faixa terapêutica ora em doses mais baixas ora em doses mais altas e sempre, desenssibilizando os receptores com o “jejum” da cannabis por 72 horas ou 3 dias.

TRABALHANDO AS PROPORÇÕES DAS DOSAGENS DE CANNABIS

Esse é o atual método que o Instituto de Medicina Orgânica aplica na prática com seus pacientes, e tem dado muito certo. Para aqueles que utilizam o CBD e o THC concomitantes, é importante e necessário o raciocínio clínico sobre a proporção entre os dois principais componentes. Lembrando que o CBD possui a propriedade que reduzir os efeitos intoxicantes do THC mas ao mesmo tempo compete pelos mesmos receptores, sendo necessário encontrar a proporção ideal entre eles para o efeito desejado.

Ao iniciarmos esses produtos, a nossa tendência é que iniciemos com aqueles que contém predominância do Canabidiol em 20 CBD x 1 THC. Com essa fórmula aplicamos as regras descritas acima, começamos com doses baixas e elevamos 25 % da dose a cada 4 dias até atingirmos uma dose limite estipulada para cada patologia. Após esse limite estabelecido ao invés de insistirmos no aumentar da dose do atual composto, optamos em mudar a proporção de acordo com cada resposta individualmente. Sendo assim , podemos introduzir posterior ao 20 CBD x 1 THC, podemos optar pelas proporções 15 x 1 , 10 x 1 , 5 x 1 , 2 x 1 ou 1 x 1.

Essa avaliação permite saber qual proporção é a mais adequada para cada indivíduo. Há casos em que necessitamos ultrapassar para os produtos com THC prevalente, então entramos agora no aumento proporcional do THC, quando necessário, seguindo para o 2 THC x 1 CBD , depois 5 x 1 , 10 x 1 , 15 x 1 e 20 x 1. Importante lembrar que cada proporção experimentada, deverá seguir as normas de introdução gradativa das doses e limite estipulado pelo profissional assistente.

PRODUTOS RICOS EM CBD COM MENOS DE 0,3 % THC HEMP / CÂNHAMO

Como regra geral, pra maioria esmagadora dos indivíduos, a cannabis com o CBD predominante com menos de 0,3 % de THC não fará com que uma pessoa se sinta chapada. 

Os produtos Broad Spectrum, que são aqueles em que os canabinoides e terpenos permanecem quando as classes do THC são retiradas, então são produtos com indicações mais amplas podendo até serem utilizadas em atletas profissionais.

O CBD isolado vendido pela farmácia e algumas importadoras, de forma alguma te fariam sentir os efeitos euforizantes ou ficar “chapado” porém em contrapartida, os isolados de CBD carecem de terpenos aromáticos críticos e outros canabinóides , que interagem sinergicamente para aumentar os benefícios terapêuticos do CBD . Os canabinóides de molécula única simplesmente não são tão versáteis ou tão eficazes quanto as formulações de plantas inteiras.

As dosagens são bem diferentes : O CBD isolado necessitará em torno de 10 a 25 mg / kg de canabidiol para o efeito desejado enquanto no Broad Spectrum as doses giram em torno de 1,5 a 5,0 mg / kg do canabidiol para o mesmo efeito. Por vezes, quando adicionado o THC nos casos em que se procura o uso simultâneo desses canabinoides, essas doses podem chegar a 5,0 a 20 mg por dose ( em torno de 0,3 a 0,5 mg / kg do canabidiol ).

MEDICINA PERSONALIZADA E INDIVIDUALIZADA

Para pessoas e animais de estimação, a dosagem de cannabis deve ser determinada individualmente . Vários fatores entram em jogo, incluindo a saúde geral e o tom endocanabinóide, que são influenciados pela dieta, exercícios, padrões de sono, estresse do dia-a-dia e genética. A cannabis é melhor usada como parte de um estilo de vida saudável.

Aqui estão algumas variáveis de dosagem a serem consideradas:

• Experiência com maconha . O paciente já usou cannabis antes?  Um usuário veterano pode precisar de uma dose maior do que um novo usuário. Ou um usuário crônico pode precisar de uma pausa de no seu uso adulto para reiniciar sua sensibilidade à cannabis.
• Hora do dia . Otimizar o uso terapêutico de cannabis pode envolver o uso de produtos com diferentes proporções de CBD : THC em diferentes momentos do dia – mais CBD durante o dia, mais THC à noite.

• Dosagem preventiva . A terapia prolongada com baixas doses pode ser vantajosa para o controle de sintomas crônicos ou para prevenir a recorrência da doença. Estudos pré-clínicos indicam que os canabinóides têm propriedades neuroprotetoras e cardioprotetoras que podem limitar os danos de uma lesão cerebral traumática ou um ataque cardíaco.

• Ácidos canabinóides . A cannabis crua e não aquecida contém CBD e THC em sua forma “ácida”, CBDA e THCA , que não são intoxicantes. Consumidos por via oral ao longo de vários meses, os ácidos canabinoides podem ser eficazes em quantidades muito pequenas. Existem produtos contendo esses canabinoides atualmente.

A cannabis é um medicamento seguro e se torna ainda mais quando utilizado nas doses recomendadas. Descobrir como aproveitar ao máximo suas propriedades que melhoram a saúde pode envolver algumas tentativas e erros. Sem problemas! Pelo menos a cannabis não é prejudicial como tantos produtos farmacêuticos aprovados pela FDA ou pela ANVISA .

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